“Uma verdadeira cena de filme de terror” foi a forma como a delegada Ana Carolina Carneiro de Abreu, titular da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (DEAM), definiu o que encontrou quando abriu a porta do quarto onde Suzana Nascimento Rocha, de 25 anos, mantinha a própria mãe, de 43 anos, em situação de cárcere privado, em Parauapebas.
A vítima estava nua, deitada em uma cama
imunda e coberta de restos de comida. O cômodo não possuía lâmpada e a única
janela estava bloqueada para que a idosa não tivesse acesso ao mundo externo.
“As baratas começaram a sair pela porta, tentei acender a luz e não tinha luz, falei para abrir a janela e não tinha como abrir porque ela colocou tábuas de madeira, lacrou a janela. A mãe não tinha acesso à luz do dia e nem à luz artificial, estava em uma situação que chorei, não tive condições de entrar. Estava deitada no colchão, sem lençol, nua, misturada com fezes, urina, insetos, cheia de bolachas de água e sal que acho que era a única coisa que ela se alimentava. No chão tinha urina, fezes, sujeira, garrafas pet…”, relembra a delegada.
Conforme a delegada, na semana passada a
Polícia Civil recebeu a denúncia de que uma senhora estava sendo mantida em
cárcere privado no Bloco 43 do Residencial Alto Bonito. No final de semana uma
equipe esteve no local, mas ninguém atendeu à porta. Uma intimação para
comparecimento na DEAM, entretanto, foi deixada.
Nesta terça (15) Suzana esteve na delegacia
para entender do que se tratava a intimação, mas tentou evitar a todo custo que
a equipe fosse até a residência. “Expliquei que se tratava denúncia de maus
tratos e negligência e nós precisávamos ir verificar, inclusive acompanhados de
uma assistente social. Na porta ela se opôs e não deixou a equipe entrar,
escondeu a chave. O investigador percebeu algo errado, me acionou, fui ao local
e expliquei para ela que iríamos entrar e que precisávamos checar a denúncia
anônima”, explicou a autoridade.
Conforme a delegada, Suzana alegou estar
envergonhada porque a mãe estaria nua. “Falei que não havia problema, que
estávamos ali para entender o que estava acontecendo e ajudar se fosse preciso,
mas quando entramos… ao abrir a porta do quarto… era uma verdadeira cena de
terror”, relata.
A delegada diz ter ouvido de vizinhos que
em dois anos e meio apenas uma pessoa viu a vítima sair da casa uma única vez.
“Perguntou onde ela iria levar a mãe e ela falou que o cartão da aposentadoria
tinha sido bloqueado e que ela ia levar a mãe resolver, ou seja, ela usava o
dinheiro dessa mãe”, sustenta Ana Carolina, acrescentando ter sido encontrado
um laudo psiquiátrico no local apontando que a vítima sofre de esquizofrenia.
“Ela utilizava o dinheiro, não a alimentava, ela (mãe) estava desnutrida e não
conseguia ficar em pé, magra, desidratada… a vítima estava delirante”, diz.
O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência
(SAMU) foi acionado e a mãe encaminhada para o Hospital Geral de Parauapebas,
onde a equipe de assistência social tenta contato com outro filho dela ou
demais familiares. “Vou mandar cópia do inquérito para a Promotoria que cuida
dos direitos e tutela de pessoas com deficiência porque essa filha não tem a
menor condição de ser a tutora desta mãe”, informou a delegada.
Ainda segundo a autoridade policial, Suzana
ainda prestará depoimento e será inicialmente autuada em flagrante pelos crimes
de cárcere privado, maus tratos, abandono material e exposição da saúde a
perigo. “Nem local de crime de homicídio me deixou chocada como fiquei vendo
uma mãe sendo tratada nessas condições”, observa.
No local também estava a filha de Suzana,
de apenas 5 anos, que foi encaminhada ao Conselho Tutelar. A criança, afirma a
delegada, estava bem vestida e alimentada, sem sinais de maus tratos. “Ela
(Suzana) estava bem cuidada e a criança também. O quarto delas era normal, com
luz e claridade. Ela deixava era a mãe abandonada e que ia morrer à míngua se
os vizinhos não denunciassem”, conclui a delegada.
Filha confessa ter descuidado da mãe
Ouvida pelo Portal Correio de Carajás,
Suzana afirmou ter descuidado da mãe após começar a trabalhar em um emprego
como diarista, o que considerava exaustivo. “Há uns dois meses eu descuidei um
pouco dela, eu estava trabalhando e à noite eu ia descansar, parei de organizar
porque ficava muito estressada do serviço, comecei a ficar desanimada, sem
querer fazer nada e fui descuidando dela”, conta.
Negou, entretanto, que mantivesse a mãe
trancafiada na casa. “Ela saía antes da pandemia e aí parei de sair com ela. Eu
me descuidei dela neste período que eu estava trabalhando, inclusive tinha
saído do emprego porque eu estava descuidando dela”, alega, afirmando estar
arrependida e demonstrando preocupação com a criança de cinco anos.
“Estou arrependida, claro, deveria ter sido
mais cuidadosa. Se eu tiver que pagar alguma coisa vou pagar, mas tô preocupada
com a minha filha, quero notícias dela e conversar com ela”, finaliza. (Luciana
Marschall – com informações de Ronaldo Modesto)
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